Jovens Agricultores do Interior sem qualquer tipo de apoio
Caríssimo Eng. José Martino,
Tenho seguido algum do seu trabalho, e constatado que é uma das
poucas vozes que tentam fazer ouvir-se a favor da defesa da agricultura e
dos agricultores em Portugal, coisa que não tenho visto fazer às
organizações de agricultores que seria supostamente
o trabalho deles.
Deixe-me contar-lhe a minha situação em jeito de desabafo.
Numa altura em que tanto se ouvem promessas de mudança no panorama
rural, de reordenamento do território e desenvolvimento do interior,
gostaria de lhe dar conhecimento do que se está a passar com os jovens
que tentam revitalizar o interior completamente
esquecido, e que só é lembrado em caso de catástrofes como as que
aconteceram recentemente.
Somos dois jovens, naturais do concelho de Trancoso, distrito da
Guarda, uma das zonas mais desfavorecidas e abandonadas de Portugal.
Provavelmente por orgulho e teimosia, ganhámos coragem para “desmatar”
terrenos que estavam ao abandono, desde que os
nossos pais os deixaram de cultivar. Podíamos ter feito como acontece
com tantos outros terrenos que há nas mesmas situações nesta zona do
interior do país. Deixar ao abandono, cheio de mato, e esperar que
ardessem todos os anos.
Não querendo seguir a opção mais fácil, arregaçámos as mangas,
estudámos a melhor cultura para a instalar, pedimos ajuda e conselhos a
quem sabia mais do que nós, tirámos todos os cursos disponíveis para
jovens agricultores, e começámos a trabalhar no
nosso projecto, com a esperança de virmos a ter algum apoio por parte
do ministério da agricultura através do PDR2020, cuja aprovação seria
crucial para que o nosso projecto chegasse a bom porto.
Iniciámos a preparação dos terrenos, e no início deste ano
plantámos 23 ha de vinha, porque achamos que é uma cultura promissora
para a região. Desde aí, temos dado trabalho a muita gente, tanto a
empresas prestadoras de serviços, como a trabalhadores
locais da aldeia.
Inevitavelmente, o nosso entusiasmo inicial está a desvanecer-se, e
teremos de abandonar o nosso projecto de revitalização do interior e da
aldeia, uma vez que a vinha está a secar e não temos como a regar. Sim
tão simples quanto isto.
Parece inacreditável, mas isto está a acontecer, porque não
conseguimos obter qualquer ajuda para instalar um sistema de rega na
vinha, e comprar um simples tractor para que possamos tratar dela.
Não conseguimos obter o apoio mais básico para que nos possamos
instalar como Jovens Agricultores, para comprar um simples tractor ou
alfaias agrícolas.
Submetemos um projecto de Jovem Agricultor em Fevereiro de 2016
(quase dois anos), e embora o projecto tenha obtido parecer favorável e
com viabilidade, não nos é dado qualquer apoio, por falta de dotação
orçamental. Como é possível continuar a dizer-se
à boca cheia que há dinheiro para apoiar a agricultura, e os jovens
agricultores, quando temos um exemplo flagrante como este, sem qualquer
tipo de apoio? Como é possível que, sabendo que a revitalização das
pequenas explorações agrícolas no interior, e imprescindível
para salvar o país do flagelo dos incêndios, não haja dotação
orçamental para apoiar os poucos jovens agricultores que ainda resistem
no interior?
Demos a conhecer este caso ao Ministério da Agricultura por várias vezes, mas que não foi dada qualquer importância ao assunto.
Já agora, gostaria de saber se está a par de situações semelhantes a
esta que têm ocorrido, e se tem alguma sugestão/conselho, sobre o que
tentar fazer para resolver esta situação.
Melhores cumprimentos,
Comentários:
1. Conheço algumas centenas de casos semelhante ao Vosso desde há muito tempo.
2. Fui o promotor e 1.º subscritor, em junho passado, de uma petição pública com o titulo "Agricultura Portuguesa - Jovens Agricultores" (ver http://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=PT85843) com o objetivo de recolher as assinaturas necessárias para que a Assembleia da República fosse obrigada a votar a petição pública para que cada um dos jovens agricultores que tivesse o seu projeto de 1.ª instalação aprovado captasse as respetivas ajudas financeira públicas de apoio ao investimento. Na minha opinião, é inconcebível que precisando Portugal de rejuvenescer o seu empresariado agrícola e rural, não aproveite todos aqueles jovens que estão dispostos a abraçar esse desafio. Este é um dos pontos mais estruturantes a mudar nas agriculturas de Portugal e que para tal deveria ter a máxima prioridade nos apoios, fazendo-se em detrimento de qualquer uma das outras medidas e ações do PDR 2020. O Ministério da Agricultura deve colocar no topo da agenda da reprogramação do PDR 2020, esta medida de apoio à instalação dos jovens agricultores. Infelizmente esta minha petição pública captou poucas assinaturas, certamente não comunicada à opinião pública de forma eficaz, pois a sua bondade é do maior interesse público para Portugal e os portugueses.
3. Defendo que, em situações de escassez de fundos financeiros face à procura desses apoios, deveria haver prioridade no acesso aos dinheiros disponíveis os investimentos localizados nos distritos do Interior de Portugal. Não é aceitável colocar em pé de igualdade no acesso a fundos públicos, iniciativas no Litoral e no Interior, quando é do conhecimento comum que no Litoral há mais iniciativas, projetos, empreendedores, sendo do ponto de vista médio mais baratos os investimentos.
4. Recomendo que escreva ao Sr. Ministro da Agricultura expondo a sua situação, bem como à Diretora Regional de Agricultura e Pescas do Centro, deputados da Comissão Parlamentar de Agricultura, Presidente da Câmara Municipal, etc. Fale com os jornalistas das estações de rádio locais, nacionais, jornais, televisões, etc. para que visitem a sua exploração e divulguem o seu exemplo, porque há muitos outros milhares de jovens na mesma situação. Não desista, insista até ser atendido
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